quarta-feira, maio 20, 2015

A beleza da novidade: -0,002%

Que Portugal se ia financiar, mais cedo ou mais tarde, a taxas negativas no mercado primário (onde ocorrem os leilões de dívida) não era surpresa para ninguém. Era uma questão de tempo até que o sinal "-" surgisse numa emissão. Já tinha estado perto de acontecer, mas a (bela) novidade surgiu hoje - quarta-feira, 20 de Maio de 2015.

O IGCP, que gere a dívida pública portuguesa, emitiu 300 milhões de euros a seis meses com uma taxa negativa - a primeira de sempre - de -0,002%. E porquê? Desde logo porque houve muita procura por parte dos investidores, o que deu outro poder de negociação. Mais importante: porque o BCE continua de armas e bagagens no mercado e compra basicamente tudo o que lhe aparece à frente, como é o caso da dívida nacional. E não digo isto de forma pejorativa. Acontece com com os leilões portugueses da mesma forma que ocorre com os dos restantes países periféricos da Zona Euro, excepto com a Grécia. Basta lembrar que a Alemanha e Espanha já pagaram juros negativos antes de Portugal.

O aspecto positivo (para Portugal!) do leilão de hoje é que em Novembro, quando tiver de pagar aos credores, o IGCP vai pagar menos do que o montante emitido hoje (daí a taxa negativa). O que nos leva a uma questão, no mínimo, curiosa: Mas o que é que leva os investidores a comprarem dívida e a perderem dinheiro? Ou dito de outra forma, por que é que Portugal vai entregar menos dinheiro do que aquele que recebeu dos investidores? 

  1. Uma das explicações está no próprio modus operandi do mercado de dívida. Isto é, muitos investidores compram agora, mesmo que a taxas negativas, porque não vão manter a dívida comprada até à maturidade. Compram agora para vender amanhã, ou daqui a uns meses. E acreditam que o vão conseguir fazer a um preço superior àquele a que compraram no leilão.
  2. Outra questão diz respeito à "falta de activos" onde investir. Escasseiam alternativas aos grandes brancos, fundos de investimento e seguradoras. Estes são, por norma, investimentos mais conservadores.
  3. Uma outra explicação, não menos importante, é a baixa inflação ou a ausência dela - como mostram os últimos dados para a Zona Euro.

Dito isto, é importante a estabilidade do mercado de dívida e do risco sobre Portugal. O país financia-se hoje a juros muitos mais baixos do que há apenas um ano; poupa nas emissões; gere melhor os calendários; e tem a seu lado o BCE que é (também) o seu anjo protector.

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