terça-feira, novembro 13, 2012

Meine liebe Angela

Querida Angela,

Reuters
Sei que estiveste no meu país. Aliás, não só tive a oportunidade de ver-te na televisão como, também, de noticiar-te. Mas isso não interessa agora. Vamos ao que importa.
A tua visita de seis horas, segundo o cronómetro cá de casa, serviu para mostrares que "nos" queres ajudar a ultrapassar este momento difícil de uma crise que também te pode bater à porta. Mas se isso acontecesse não seria a mesma coisa... pois não?
A tua boa vontade é muito bem-vinda, assim como os investidores que trouxeste. As tuas palavras, de grandeza simples, protegeram as costas do "nosso" Primeiro-ministro. Mas no meio de toda a parafernália, parece-me que te esqueceste de alguns pormenores.
Como sei que te preparaste antes desta visita, deves provavelmente ter ouvido falar em vídeos que fizemos para te mostrar; soubeste, por terceiros, que trabalhamos mais do que os alemães; que temos menos dias de férias; que recebemos menos... e por aí fora. O resto da história já tu conheces bem.
Antes de continuar esta breve carta queria apenas lembrar-te que não pretendo, de todo, generalizar a TODOS os portugueses o que vou dizer a seguir. Mas tu conheces-me e sabes que não seria capaz de o fazer. Dito isto, chegou o momento de voltarmos aos "pormenores" que referia em cima e que me parece que te esqueceste!
A verdade é que este belo país ignora muitas vezes, se calhar vezes de mais, uma palavrão denominado por Meritocracia. Prefere, ao invés disso, privilegiar a cunhocracia, a interessocracia ou, em alguns casos, a estupidezocracia. E são estes os pormenores que talvez te passaram e que podem explicar, não tenho a certeza, o porquê deste país que até tem um sol e um mar tão belos não conseguir sair da cepa torta. Mesmo com a ajuda da Troika e com todas as imposições. Por esta altura deves estar a perguntar-te: "Mas que diabo, será que não há bons profissionais naquele país?". A resposta é fácil: são bons, mas muitas vezes não interessam porque não cumprem os outros requisitos. Tás a ver?
Percebes agora por que é que, antes de ti, já o Orson Welles ficava maluco com a incompetência? Ou por que é que o Oscar Wilde dizia que" aqueles que não fazem nada estão sempre dispostos a criticar os que fazem algo"?
O teu conterrâneo, o Einstein era meio pro radical, mas também dizia umas coisas acertadas. Por exemplo, que "o único lugar onde o sucesso vem antes do trabalho é no dicionário"!
Percebes agora que é nos pormenores que, se calhar, este belo país falha?

Mit liebe,

HBM

quarta-feira, setembro 26, 2012

Sacrifícios para quê?

Há dias assim…
Em que o mundo parece que para.
Em que as horas passam devagar e o sol desaparece para dar lugar à chuva.
Dias há em que os mercados financeiros mudam de cor e começam a penalizar tudo e todos.
Semanas em que Portugal, debaixo de austeridade, sofre os ataques de baterias escondidas, de atacantes emboscados, desconhecidos.
Dias em que um gorila, de fato passado e peito feito, impede um jornalista de fazer informação e cala um jovem estudante que está, talvez com razão(!), insatisfeito com o estado do país.
São dias difíceis de austeridade, de sacrifício sobre o sacrifício. De dor sem queixas; de exigências sem rumo e sem sentido.
A luz ao fundo do túnel, como disse alguém recentemente, não é a da esperança mas antes a do comboio que vem de frente a alta velocidade.
O primeiro-ministro (o Primeiro de todos no país, o chefe de governo) cita Camões esquecendo-se que o tempo dos Descobrimentos faz parte de um passado, infelizmente longínquo.
Há dias em que se acredita que a Justiça é independente, neutra e racional… Dias em que os cidadãos exigem que os responsáveis por esta crise, tão familiar, sejam responsabilizados. Mas serão?
Dias em que os noticiários terminam da mesma forma que começaram.
E é por isso que vale a pena relembrar Camões (e os Descobrimentos). Não porque o primeiro-ministro o citou. Mas porque vale a pena lembrar que noutros tempos, noutras vidas, fomos pioneiros. Soubemos inovar.
“As armas e os barões assinalados,
Que da ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados.”
 


Os Lusíadas, I, 1

domingo, maio 27, 2012

Zona Euro por um canudo


"Todos queremos que a Grécia permaneça na zona euro" - Angela Merkel (19/05/2012)


Sem confiança, dinheiro ou perspectivas. É assim que a Zona Euro, uma união monetária (porque partilha a mesma moeda: o Euro), enfrenta o Presente sem saber como será o Futuro. E olvidando a divergência política. Trocando por miúdos… ninguém se entende porque cada líder defende os interesses do seu país.

Foi para isto que se criou a Zona Euro? Da teoria ao papel e do papel à prática, o globo e a própria região do Euro deram muitas voltas. Podem os mais cépticos dizer que a Crise, ela pois!, deu a volta aos políticos, aos economistas, aos denominados Especialistas. Só acertaram aqueles que, como Nouriel Roubini, foram proferindo uma afirmação a cada movimento de rotação da terra. Os outros limitaram-se a acertar… ao lado!

Contágio? Nem pensar. Não faz sentido falar disso. Se acontecer um cataclismo ficará circunscrito à Grécia. Os outros países, como Portugal, Espanha e até Itália, estão protegidos. “Os líderes Europeus estão connosco” trazem os ventos do Governo. Dizem os próprios citados. Na prática? Cada “país pedinte” (e já são três: Grécia, Irlanda e Portugal) deve resolver os seus problemas mesmo que para isso crie mais problemas. São juros elevados, prazos curtos e uma maratona de medidas austeras que obrigam o “atleta” (já de si cansado) a correr 40 km em sprint.

E por que deixam os líderes que as situações se tornem de emergência? De urgência? De falta de soluções? Faz sentido falar de Eurobonds (emissão conjunta de dívida dos países do Euro)? Alguns líderes, como François Hollande, defendem que sim. É uma forma de homogeneizar os juros pagos por estes países. Evitaria que, por exemplo, Portugal pague juros de 4% sobre Bilhetes do Tesouro a 3 meses, enquanto uma Alemanha paga… praticamente zero. Mas a Alemanha de Angela Merkel garante que ainda não estão reunidas as condições para se avançar com esta “inovação”.

A verdade é que quanto à Grécia e aos gregos ninguém sabe ao certo o que vai acontecer. Se deixam o Euro depois das novas eleições, a 17 de Junho, ou se optam por manter-se na moeda única… sendo que vão precisar de mais dinheiro de uma forma ou de outra.

A Irlanda parece ter os problemas, dentro do possível, sanados. Mas Portugal parece estar a navegar ao sabor da maré e da austeridade e com um novo pedido de ajuda no horizonte.

E nesta União Monetária pouco unida surge mais um país, que embora não tenha sido ainda auxiliado externamente, está a preparar-se para isso. Espanha e o governo precisam de dinheiro para auxiliar a Banca, a braços com activos imobiliários que colapsaram com a bolha que se criou no país. Como se não bastasse, há ainda as regiões autónomas que não são mais do que cofres vazios com contas para pagar. E são muitas: as regiões e as contas!

Cimeiras e opiniões à parte, o melhor é mesmo esperar para ver o que acontece. Entretanto, vai-se vendo a Zona Euro por um canudo.

sexta-feira, janeiro 20, 2012

"Fui despedido"

v.t. Mandar embora com brandura ou não; dispensar: despedi a empregada. V.pr. Afastar-se, dizer adeus: despedir-se de um amigo; despedir-se da vida de solteiro.

É certamente a expressão mais vezes escrita nos últimos meses pelo media mundiais. Mais vezes ouvida na rádio, na rua, em casa! Vista diariamente um pouco por todo o lado. E ao contrário do significado na maioria das situações, os despedimentos não ocorrem "com brandura". São duros, inesperados, por vezes injustificados.

É a realidade do país e do mundo. Das empresas. Das pessoas. É uma luta desigual e pouco democrática. Por vezes justificada. Outras (vezes demais) sem sentido. E porquê? A resposta óbvia e mais vezes ouvida é já conhecida de todos: "É a crise!"

É verdade! É a crise. Mas é também a falta de rumo; a mediocridade da gestão que se faz; são desperdícios injustificados. A crise é aquilo que dela se faz. É a desorganização; a desorientação; a falta de conhecimento. É um caldo de muita incompetência e de algumas, poucas, situações que são verdadeiramente incontroláveis. Mas estas últimas são poucas. Não são argumento que per si valham e sejam justificação para tudo.

Despedir é um tsunami que varre as planícies e chega às montanhas com a mesma agressividade de um... dois, três... sete anos sem trabalho. É a depressão que mata, choca, aborrece. É a depressão que deprime e desgasta.

Não há crise sem despedimentos. Não deveria haver despedimentos sem crise, ou justificados apenas pela mesma. O que me leva a reflectir sobre a seguinte afirmação:

"A essência da propaganda está em levar as pessoas para uma ideia de forma tão sincera, com tal vitalidade, que, no final, elas sucumbem completamente a essa ideia, de modo a nunca mais escaparem dela".*

É mais do que óbvio que os portugueses já se habituaram a esta "ideia". Não escapam dela, mesmo que o quisessem. É a vida de cada um. A realidade de todos. É o choque do choro surpreendido pela notícia. É o ambiente de pesar. São os cochichos. É a dura realidade. Necessária talvez, em nome das reestruturações, da maior competitividade. Da qualidade!

Para trabalhar é preciso ter ambição, qualidade, vontade. E já agora alguma sorte para não se ser mandado "embora com brandura".



*Joseph Goebbles, ministro da propaganda de Hitler.