sexta-feira, maio 22, 2015

Conte até 3 e não respire

O meu artigo desta semana no Diário Económico:

O número 3 tem uma elevada carga simbólica. O mesmo é dizer que está associado à união, ao equilíbrio e à perfeição.

Basta lembrar que são três os poderes ligados à democracia – jurídico, executivo e legislativo. Em Portugal, o 3 foi, nos últimos anos, sinónimo de ‘troika’: os 3 elementos do FMI, BCE e Comissão Europeia que impuseram esforços e, como refere a oposição ao Governo, “deixaram o país mais pobre”.

O que escapa aos portugueses é que temos tido outra ‘troika’, desde que vivemos em democracia. Refiro-me ao PSD, PS e CDS-PP. Têm sido estes três partidos a decidirem o nosso destino. Mas sem saberem contar até 3. E isso tem-nos saído muito caro porque os interesses de cada partido têm sido confundidos com os interesses da nação! A psicologia explica que a chegada de um filho obriga o casal a implementar novas regras e hábitos. Ensina-o a contar até 3.

Será que também os partidos do arco da governação podem, finalmente, esquecer as quezílias e aprender a contar até 3? É pura aritmética.

quarta-feira, maio 20, 2015

A beleza da novidade: -0,002%

Que Portugal se ia financiar, mais cedo ou mais tarde, a taxas negativas no mercado primário (onde ocorrem os leilões de dívida) não era surpresa para ninguém. Era uma questão de tempo até que o sinal "-" surgisse numa emissão. Já tinha estado perto de acontecer, mas a (bela) novidade surgiu hoje - quarta-feira, 20 de Maio de 2015.

O IGCP, que gere a dívida pública portuguesa, emitiu 300 milhões de euros a seis meses com uma taxa negativa - a primeira de sempre - de -0,002%. E porquê? Desde logo porque houve muita procura por parte dos investidores, o que deu outro poder de negociação. Mais importante: porque o BCE continua de armas e bagagens no mercado e compra basicamente tudo o que lhe aparece à frente, como é o caso da dívida nacional. E não digo isto de forma pejorativa. Acontece com com os leilões portugueses da mesma forma que ocorre com os dos restantes países periféricos da Zona Euro, excepto com a Grécia. Basta lembrar que a Alemanha e Espanha já pagaram juros negativos antes de Portugal.

O aspecto positivo (para Portugal!) do leilão de hoje é que em Novembro, quando tiver de pagar aos credores, o IGCP vai pagar menos do que o montante emitido hoje (daí a taxa negativa). O que nos leva a uma questão, no mínimo, curiosa: Mas o que é que leva os investidores a comprarem dívida e a perderem dinheiro? Ou dito de outra forma, por que é que Portugal vai entregar menos dinheiro do que aquele que recebeu dos investidores? 

  1. Uma das explicações está no próprio modus operandi do mercado de dívida. Isto é, muitos investidores compram agora, mesmo que a taxas negativas, porque não vão manter a dívida comprada até à maturidade. Compram agora para vender amanhã, ou daqui a uns meses. E acreditam que o vão conseguir fazer a um preço superior àquele a que compraram no leilão.
  2. Outra questão diz respeito à "falta de activos" onde investir. Escasseiam alternativas aos grandes brancos, fundos de investimento e seguradoras. Estes são, por norma, investimentos mais conservadores.
  3. Uma outra explicação, não menos importante, é a baixa inflação ou a ausência dela - como mostram os últimos dados para a Zona Euro.

Dito isto, é importante a estabilidade do mercado de dívida e do risco sobre Portugal. O país financia-se hoje a juros muitos mais baixos do que há apenas um ano; poupa nas emissões; gere melhor os calendários; e tem a seu lado o BCE que é (também) o seu anjo protector.

domingo, maio 10, 2015

TrAPalhadas

Terminaram os 10 dias de greve dos pilotos da TAP. Ou melhor, terminou a paralisação de ALGUNS dos pilotos. Pode dizer-se que esses ficaram duplamente paralisados: por um lado, porque não voaram e, por outro, porque afinal os efeitos da greve ficaram muito aquém do desejado. Mas não sem antes provocar - como escrevi recentemente - fracturas profundas.

Foi-se a (pouca) confiança na companhia aérea que dificilmente se recupera. E quando o fizerem terá passado tempo. Muito tempo! Um turista francês dizia, naturalmente aborrecido por ficar em terra quando o intuito era o de voar, que "a TAP é deplorável". Este é um dos danos colaterais desta greve: todos são tomados por igual. Dito de outra forma, é como se TODOS - e não é verdade! - tivessem aderido à paralisação. Mas TODOS perdem: a empresa, os trabalhadores e o país.

A segunda maior greve da história dos pilotos da TAP terminou com uma média de 30% de voos cancelados diariamente, o que significa que todos os dias - e em alguns estes números foram superados - realizaram-se mais de 70 por cento dos voos.

O sindicato (SPAC), através do seu presidente, foi o actor principal de um enredo sem história e com momentos de puro terrorismo, como o dos "prejuízos de 30 milhões de euros que infligimos à TAP". Ainda assim, e se é que há algo de positivo nisto, os prejuízos ficaram bem aquém dos 70 milhões inicialmente projectados. Mas repito: provocaram-se fracturas profundas que podem provocar danos também no processo de privatização. No final desta semana, vamos ficar a saber quantas propostas foram entregues ao governo.

Agora, os mesmos pilotos que - e isto são factos - deixaram a TAP num estado de saúde ainda mais crítico, ponderam avançar com nova greve. Estão no seu direito. No entanto, a questão que se deve colocar é racional avançarem com nova paralisação nos tempos de correm, mesmo beneficiando desse direito consagrado na constituição.

Winston Churchill disse a certa altura da sua vida que "fanático é o sujeito que não muda de ideia e não pode mudar de assunto". Será que ainda é possível mudarmos de assunto?

quarta-feira, maio 06, 2015

Mercados à parte...



Sou jornalista económico. Não sou economista, investidor ou especulador de mercado. Mas lido, diariamente, com os mercados financeiros. Enquanto jornalista aprendo, apreendo e tento - é esse o meu dever - explicar aos telespectadores o que são e como funcionam. 

Falar de Mercados Financeiros é tão abrangente como enumerar todas as cidades ou localidades do globo. É preciso método, estudo e a ajuda preciosa daqueles que - esses sim! - gerem diária e directamente vários tipos de activos. São eles os comentadores do Fecho de Contas e do Bull & Bear que me/nos ajudam a melhor compreender o mundo da alta finança: as cotações; os altos e baixos dos índices; as aquisições e fusões e os colapsos. Juntos, tentamos perceber até os comportamentos mais irracionais do mercado. Até esses merecem uma explicação. 

Como explicou um dia Bill Miller, antigo ‘chairman' e CIO da Legg Mason Capital Management, "como os espelhos dos parques de diversões nem sempre reflectem correctamente o nosso peso, também os mercados nem sempre reflectem de forma correcta as informações".

Fazer notícias económico-financeiras é isto mesmo. É não deixar que os "exageros" do mercado, das decisões, dos negócios afectem a análise, que se pressupõe racional. É isso que faço no Fecho de Contas e no Bull & Bear.

Em estúdio não nos propomos cumprir a regra de ouro de Waren Buffett: "nunca perca dinheiro". Preferimos ter a nossa própria regra: analisar o mundo económico e financeiro sem tendências mas aceitando que há dias em que temos de os enfrentar: o Bull e o Bear, entenda-se.

Texto publicado hoje no Diário Económico, no âmbito dos 5 anos do ETV.